sábado, 7 de janeiro de 2012

Epifania. (sentir)

Afinal, gostar é isso, não é?
Ser livre para correr aos braços de quem quiser,
e ainda assim só desejar a um certo par. 

Desencanto por Romeus.

Largue de tonteira, homem! E sim, isto é uma ordem. Veja só como o tempo nos fez íntimos, nem me resta o receio de falar algo que soe como manipulação. Nem me importo que não goste de ordens… O que me importa mesmo, é arrancar da tua mente essa ideia absurda de que não me serves. Tu me serves como nunca achei que fosse possível. Tu encaixou-se em mim de um modo infatigável. Sei que soa clichê, mas o medo de parecer piegas demais, também é algo que perdi com tamanha intimidade. Achas que eu perderia todo o receio que tenho se estivesse vivendo com um Romeu? Só tu consegues me proporcionar conforto tamanho, conforto o suficiente pra ser quem sou. Pra mostrar tudo que compõe a minha essência, um tanto prolixa, confesso. Sei que vez ou outra, te parte o peito não poder me dar o tanto de presentes que achas que mereço, mas digo-te com toda a certeza que me é permitida: enquanto tu estiveres ao meu lado, me dando todos os mimos e afagos possíveis, nenhum presente do mundo vai ser mais valioso. De que me valeriam vestidos caros e jóias raras, se não tivesse teus beijos pela manhã ou tua voz arfada nas noites frias? Quero apenas a ti e não a tudo que queres me dar. Ah! E também não desejo o homem mais robusto e de grande porte desfilando ao meu lado, não. Esse bobo romântico e meio careca já me serve, afinal é a ele que amo e que quero estar sempre perdida entre os braços magrelos. Lembre-se disso viu? Eu te amo e também amo teus braços magrelos. Não vá encher-se de desvaneios quando por acaso eu viro o olhar a algum cara musculoso que passa do outro lado da calçada. Mas até acho bonito te ver cheio de ciúmes, encolhendo o peito quando falo em outro rapaz. Repito, deixe de pensar bobagens! Nunca fui fã de romances perfeitamente lapidados, sabes do meu encanto pelo imperfeito. Nunca fui dessas moças que passaram a juventude inteira esperando o príncipe encantado para levá-la a um ‘felizes para sempre’. Nunca suspirei de encanto lendo esse romances épicos… Gosto de contos atuais, onde você aceita a ideia de abandonar-se na vida de outra pessoa, mesmo tendo plena consciência de que mais cedo ou mais tarde, por um motivo pouco importante, iram separarem-se. Quando te peço para ficar assim para sempre, sabes que não implico por algo infindável, apenas te quero no para sempre que ouse durar a reciprocidade dos nosso sentimentos. Sei que um dia acabará, mas enquanto meu peito clamar pelo teu refúgio, largue a tonteira e me pegue em seus braços. E me ame como se não houvesse amanhã, pois feliz ou infelizmente, talvez não o tenha de fato.

Desperdício de uma vida pouco usada.

Aos olhos de Olga, qualquer espaço pequenino entre os cômodos do velho apartamento facilmente se convertia em um refúgio encantador. Ócio era tudo que coloria os dias solitários da moça, então parar em um lugar apertado e pouco cômodo, apetecia perfeitamente à ela. Parava e pensava. Suspirava e se rendia. Se rendia ao brilho no olhar, derivado das nuvens onde sua cabeça batia. Daí o mundo ficava belo, simplório por demais, porém ainda assim extremamente belo. Perdia-se:

'Havia um jardim florido, e Olga acordava cedo todas as manhãs para regar às plantas e passear com o seu cachorro. Uma, duas, três voltas na pracinha miúda e simpática que havia a duas quadras da sua casa. Ela voltava e o moço ainda dormia feito anjo, ela queria beijá-lo, acariciá-lo… Mas tinha receio de acabar com toda a beleza que se fazia presente ali, quando aquele anjo fechava os olhos e descansava por alguns instantes. Ela o apreciava por pouco tempo e resolvia preparar um café-da-manhã digno de um homem tão bondoso quanto aquele, que aceitou dividir sua vida com a da própria Olga. Ele sabia que ela era fria às vezes, sabia que pela manhã os cabelos dela estariam volumosos e sem brilho, sabia que nem todo dia ela iria acordar com um sorriso no rosto. Sabia também, que apesar de ser calma, algum dia ela iria se render a agonia e gritá-lo. Sabia que iriam discutir uma ou muitas vezes, mas ainda assim aceitou ficar ao lado dela por tempo indeterminado. Pra sempre talvez… Enquanto ela tirava o bolo de fubá do forno, o moço aparecia sorridente na porta da cozinha, se aproximava e a tocava os lábios. 
_ Olguinha, meu bem! 
Ele a abraçava e a enchia e beijos. O dia inteiro era passado assim. Transbordando afeto, carinho, alegria… Às vezes assistiam filmes épicos, plantavam flores no jardim do quintal, brincavam com o cachorro e logo teriam um filho. Para ensiná-lo a arte de ser feliz. Sem luxo, sem palácios ou sem fama. Ensinariam ao pequeno como fazer de tudo um motivo para ser feliz.' 

E então o vento fazia os galhos da árvore velha baterem na janela, fazendo barulho suficiente para tirar Olga do seu mundo ideal. Ela despertava do transe de sonho e sorria. Sorria sem nenhum motivo aparente. E seguia sua vida repleta de tédio, recheada de nada. Ela não tinha par, não tinha cachorro, jardim ou filho. Tudo que Olga tinha, era uma mente. Uma mente que vivia perdida dentro de si. Correram-se alguns anos e as tardes da moça sucediam-se da mesma forma. Ocorreu que nas noites ela saía, dançava, tomava um café e voltava para seu apartamento. Mas logo conheceu um moço. Casaram-se, mas não moraram em uma casa com um belo jardim no quintal, não tinham um cachorro, Olga não acordava cedo e filhos não estavam por vir. 
Tanto tempo de sua vida, Olga dedicou a sonhar e agora de que valiam? A ingenua moça achava que sonhar, traria a condição de tornar real em um futuro não muito distante. Equivocou-se. Antes sonho, agora apenas frustração. Mas como toda boa moça com um bom coração, ela ainda deixou uma lição no fim de sua história. 
Um sonho, só será para sempre perfeito, se jamais for concretizado.
Pode até parecer tolice, mas o bonito do sonho é poder sonhar. É se perder em um universo inexistente e saber que, trazê-lo para a realidade não vem com a garantia de que será tão belo quanto em mente.  Mas ela ainda foi feliz, mesmo sem sonhos concretizados. Ela tinha um par e certos aspectos do sonhos até copiaram-se na realidade. Ela tinha afeto, carinho, amor… E seu amado a chamava de Olguinha em algumas manhãs. A moça sonhou, enquanto era tempo de sonhar. E também soube viver, enquanto era tempo de viver. Eis a solução.   

Que o frio invada o corpo, mas jamais nossa alma.

Perdoem a insensatez! Era apenas uma mocinha.

Não que fosse gélida, fria talvez… Mas ocorre que aquele pseudo-egoísmo ou egoísmo de fato, era confuso demais e ainda assim, fazia todo o sentindo. A mocinha tola que se magoa com as coisas e finge que não houve nada; a mocinha tola e orgulhosa que não perdoa traição, ainda que deseje àquele moço mais que tudo; a mocinha tola e sentimental que enche os olhos d’água e fala que foi só um cisco e todas essas variantes de ‘mocinhas tolas’ não cabiam mais naquela mocinha. Ela ainda era tola, ainda era orgulhosa e ainda sentimental, mas encontrou um novo aliado e logo aliou-se ao amor-próprio. Há quem chame de egoísmo, mas o outro termo melhor a apetece. Então ela usou de sua tolice para encontrar um moço tão tolo quanto ela. Usou de seu orgulho, para ousar ser feliz. Nada mais de penar na vontade, apenas almejava à felicidade própria e se perdoar, até mesmo traições, fosse necessário, o fazia sem medo. Pra quê largar de quem lhe faz bem? Porque tal alguém tocou outros lábios ou outra pele? Bobeira. Contanto que continuasse a tocar os lábios da mocinha e sua pele também, tudo estava encantador. Usou de seu sentimentalismo para falar tudo que lhe desse vontade, até mesmo aqueles frases tão piegas, tão surradas, tão inválidas. Falava o que viesse à sua cabeça, sem receio. Contava de seus sentimentos para a pessoa que a fazia senti-los e assim, ouvia tudo que desejava e findava feliz. Antigamente ela queria arrancar sorrisos de outras pessoas, mais precisamente de outro rapaz. Mas ele a arrancou lágrimas e magoo-a tão profundo, que a mocinha decidiu que desde então apenas sorriria. Não importava quantas palavras bonitas a dissessem, nem tão pouco quantos afagos lhe dessem, ou até mesmo quanto calor daquele corpo resolvessem abrandar. Nada mais a faria querer arrancar risos alheios, queria todos os risos do mundo bordados em seu próprio rosto. Ainda tinha um coração brando, belo, bom… Ainda sorria em perceber que fazia alguém sorrir. A sua essência sempre seria a mesma e ela sabia disso, até se orgulhava. Mas esconder-se por trás de uma fantasia de Narciso não parecia má ideia. Querer sua felicidade acima de qualquer coisa não parecia algo tão feio. Afinal, na vida todos precisam escolher suas prioridades e a mocinha já escolhera a sua: Ser feliz, bordar sorrisos em seu rosto! Alguns a taxavam de egoísta, outros de amargurada. Mas que mal pode haver em aprender com os acontecimentos da vida? Se não aprender vivendo, como irá aprender? Ela se contia, abraçava o moço que lhe dava beijinhos, e sorria.

Os contos de fadas trouxeram insegurança.

Acontece que eu sou tão pequenininha, tão sem-gracinha, tão no diminutivo. Sou menina miudinha, causo tanto problema. Tenho um corpinho miúdo, sem curvas, sem chance de estrelar capa de revista. E esses meus cabelos bagunçados, que saem num emaranhado maior pela manhã. Esses meus braços fininhos, minhas pernas magrinhas. Vivo falando de sentir, de colorir, de flores, de coisas tão infantis. E ele, Zé… Ah! Ele é tão alto, bonito e corajoso. Tem braços firmes, um toque sutil e me beija com carinho. Ele não consegue disfarçar o brilho no olhar quando me fita e gosta de me puxar pela mão. E aí eu sorrio, apesar de sentir um aperto no peito quando uma moça alta e curvilínea passa por nós. Mas ele me toca os lábios e sussurra baixinho aquelas palavrinhas agradáveis, então eu abro meu sorrisinho amarelo, me perco e peco. 

Piedosa Vingança